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03 Jan
156. Guardar as gavetas

Cheguei no corredor e foi difícil passar para acomodar tripé e câmera.  Mas eu já sabia que isso aconteceria. Eu escrevi antes e preparei o programa performativo ali mesmo.

Eu fui retirando as gavetas do caminho e levando para o lugar correto. Me dei conta que as gavetas dos quartos da Bu, Dedé e meu tinham numeração de 1 a 30. Cada armário tem um gaveteiro de 10 gavetas. No quarto da minha mãe, móvel do quarto da Bu, cozinha, papeleira que está no corredor, máquina de costura e penteadeira, possuem gavetas diferentes. Eu sabia quais gavetas eram de qual lugar não somente pela forma ou cor, mas também por estarem dispostas no corredor na ordem que eu fui retirando. Fui colocando como ondas de um mar que vai mudando a maré. Primeiro chegaram até a ponta da sala e foram chegando menos e menos. Ou quase isso. 

Em alguns momentos eu pratiquei meditação caminhando. Observava meus pés, a troca de peso de um pé-perna para outro-outra. Os ruídos de cada cômodo. Eu queria ter gravado o canto dos passarinhos, eram muitos e cantos distintos. 

Eu demorei mais para guardar do que para espalhar. Depois de meditar, eu escrevi:

As gavetas parecem iguais, mas não são. Todas possuem números escritos no fundo. 3 quartos e gavetas de 1 a 30. Começando no quarto da Bu. Marcenaria antiga. As gavetas são iguais e não são. Desenho, recorte, segue a mesma forma, mas não encaixam se não for no espaço correto.

A madeira usada em cada gaveta é do mesmo tipo, mas o tempo passou e elas ficaram com coloração diferente. As gavetas do meu quarto são as mais castigadas. 

Eu as tirava do lugar todo tempo. Eu tirava a gaveta tida e virava no chão. Acho que a Sônia contou que sua mãe dizia que só assim se acha o que procura. 

As gavetas da cozinha são bem diferentes e mais pesadas. 

A Bu tinha gavetas de madeira amarela na escrivaninha.

Tem um Baú também. Pensei se é possível entrar lá.

A casa tem muitos esconderijos e coisas que eu nunca toquei.

Eu toquei gavetas que nunca havia tocado. 

Achei poemas que minha mãe escreveu.

E agora tenho que ir.


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